Renato Fernandes
Tempestade Imperfeita
Você não lê nos jornais Leia-se, não há jornais De qualquer modo Eles nada trariam Sobre a tempestade A grande tromba d’água Que a todos levará Em sua sanha carnívora A infame chuva trifásica Gestada por três poderes Endossada por trinta sátrapas Avalizada por trezentos cínicos Aprovada por três mil sicofantas Para a glória de trezentos mil facínoras E a danação de milhões de fantoches Abrupto, longo e lastimável aguaceiro Pegou-nos de surpresa, iludidos Quando achávamos que as nuvens pesadas Nunca mais voltariam em cólera Mas, incautos, fizemos a dança da chuva Intrépidos, trouxemos os patos de borracha E ansiosos pelo banho em novas águas Fomos levados pela enxurrada Afogados nos jatos da mudança Que emanam dos honoráveis cus Daqueles que de costas reverenciam O ocaso dos que não sabem nadar Agarremos-nos, então, uns aos outros E não continuemos mais a contar Quantos queriam o sol E quantos pediram pela chuva Façamos logo uma jangada Com os braços e pernas dos que se afogam E tomemos de assalto a arca dos eleitos Enquanto aguardamos o amainar dos tempos Salvemos as crianças e os idosos A todos e a cada um Antes que o raio da intolerância Desça faiscante pelos céus em fúria E a todos fulmine E a nação termine